O debate é antigo, “há
racismo em Monteiro Lobato?”, mas voltou à tona em 2010, em função de um
parecer do Conselho Nacional de Educação que recomenda que o livro Caçadas de Pedrinho, do autor em questão,
deixe de ser distribuído às escolas públicas, pois há presença de estereótipos
racistas. O debate criou polêmica:
escritores, educadores e especialista em literatura infantil se posicionaram e
no fim das contas o ministro Fernando Haddad foi contra o parecer do Conselho e
tudo ficou como antes.
Porém, debate posto,
é importante entendermos os dois lados da questão, no início da década de 80,
por exemplo, um livro didático foi proibido de circular, pois trazia um
poeminha de Mário Quintana quer foi censurado, o poema dizia: com x escrevo
xícara, com x escrevo xixi, menino, não faça xixi na xícara, o que vão pensar
de ti?” A proibição se deu por causa do uso da palavra xixi, considerada
imprópria para crianças. Há pouco tempo, aqui em Juiz de Fora, a polêmica
ocorreu, pois alguns pais tentaram proibir a utilização de um material de
língua portuguesa que trazia um poema do escritor Férrez que trazia algumas
palavras consideradas chulas. Ainda, aqui na zona da mata, na cidade de São
João Nepomuceno, um professor de literatura foi demitido, pois levou para suas
aulas no ensino médio um conto erótico de Ignácio de Loyola Brandão, os pais
logo pediram a cabeça do portador do conto. Nos três casos acima nenhum dos
textos deixaram de existir por causa da censura feita, pelo contrário, a
censura de certa forma instiga a curiosidade.
Para mim, não há dúvidas,
Lobato, como a maioria dos homens brancos, da alta aristocracia da década de 30
e 40 carregava ainda os resquícios escravocratas e era sim racista. Isso é
retificado por Zinda Maria Carvalho de Vasconcelos no livro O universo ideológico da obra infantil de
Monteiro Lobato, que na página 68 do livro apresenta: “Apesar de no início
da Geografia ser dito que só há
grande diferença entre os habitantes da Terra na cor da pele (uma questão de
pigmentos), no decorrer dos livros percebe-se que há certos povos considerados
superiores”.
Diante disso, proibir
a leitura da obra de Lobato seria o caminho na construção de uma sociedade mais
justa, igualitária e sem preconceito racial? Tenho certeza que não. Assim como
já posto pelo colega Raphael Reis, acredito que a leitura contextualizada da
obra de Lobato, bem conduzida por professores de Literatura, História e das
Ciências Humanas, pode levar a um debate qualificado e fazer aos neoleitores
entenderem que Lobato foi um homem de seu tempo e sua obra representa esse
tempo.
Havemos de pensar,
ainda, a literatura como um discurso lúdico e inacabado, ou seja, como sinônimo
de ruptura, isso faz do leitor alguém que não é passivo ao que lê, pelo
contrário, o leitor é sempre alguém que vai dialogar com o texto literário,
isso significa que pode gostar esteticamente do que lê, mas não concorda com
a situação lida.
Cito aqui um trecho
de um artigo que escrevi para a revista Educação em Foco, v.13:
"A literatura é um
discurso que, como o homem e a história, está sempre em construção. Por ser um
discurso em construção, é aberto, dinâmico e sem ponto final. É por isso que
ela serve muitas vezes como retrato de uma época, pois sem ter a preocupação em
retratar a realidade, o escritor de literatura acaba quase que brincando, e
numa espécie de jogo, usando do lúdico,
retratando sua visão do momento histórico. Vale lembrar que o escritor passa
não somente sua visão de mundo, porém a visão acerca dos discursos que o
influenciam, ou que chegam até ele. O discurso
literário, como qualquer outro discurso, parte do interdiscurso, ou seja, de
uma formação discursiva já existente que serve de base. (p. 60, 2008)".
Olá, Carla!
ResponderExcluirConcordo com você quando diz que a literatura é um discurso aberto e em construção. Taxar Lobato de racista e proibir os livros dele é uma tentativa infeliz de fechar os significados da obra, além de superdimensionar o caráter ideológico que subjaz ao texto e que, como você bem destacou, poderia ser melhor trabalhado se se assumisse a datação da obra lobatiana.
Em tempo: apesar de tudo, acho que nenhum livro do Lobato deve ser proibido. É um autor que ensina aos seus pequenos leitores a sonhar e, nos tempos que correm, só com muito pó de pirlimpimpim para buscar novos mundos.
Ailton,
ResponderExcluireu me tornei leitora lendo Monteiro Lobato, por isso tenho certeza que a literatura só abre portas e janelas e nunca é capaz tornar alguém racista ou preconceituoso, por isso minha defesa.Obrigada por suas considerações.
Grande abraço,
Carla
Olá Carla!
ResponderExcluirAcredito que trabalhar com Monteiro Lobato pode auxiliar o aluno a refletir sobre as personagens e suas vivências percebendo o espaço/tempo, por exemplo.
Abs!
Olá, Eliza Kelly,
ResponderExcluirBom ver você por aqui e saber que pensa assim: não é proibindo leituras que vamos eliminar o preconceito da sociedade, mas certamente discutindo essas leituras no espaço/tempo caminharemos para tal.
Abs,