terça-feira, 1 de maio de 2012

"O inferno são os outros!"

O livro do mês de setembro de 2011 do Grupo Prazer da Leitura foi Entre Quatro Paredes do escritor e pensador existencialista Jean-Paul Sartre. Para alguns do grupo essa foi considerada a melhor obra de 2011, para outros, uma das melhores.


No último domingo (29/04), ao chegarmos para a discussão do livro de poesias de Afonso Romano de Sant'anna Sísifo desce a montanha, o nosso anfitrião, Marcos Godoy, nos convidou a acompanhá-lo, depois de nosso encontro, ao GTMG, onde ocorreria uma livre adaptação do texto de Sartre. Discutir um livro que trata da vida e dos medos da morte e depois assistir a uma peça que ilustra o outro lado da vida pareceu-nos bastante interessante para um início de noite de  domingo.



Apesar de morar em Juiz de Fora desde que nasci (com alguns períodos fora da cidade), nunca havia ouvido falar do Grupo de Teatro Mendes Guttierrez que funciona, desde 1994, num prédio antigo na rua Barão de Santa Helena, no bairro Granbery, próximo ao centro da cidade.

A peça em questão chama-se Infernos e faz parte de um projeto chamado Nesta sexta tem teatro - sempre no último fim de semana de cada mês o grupo apresenta uma mesma montagem na sexta-feira, sábado e domingo. A próxima acontecerá 25, 26 e 27 de maio e tem o nome de Fala Comigo...

Bem, depois de todo esse nariz de cera, vamos à peça: Como é assistir uma adaptação de uma obra tão complexa e admirada? Pois é, vi que algumas falas foram fiéis ao livro, isso me fez voltar à leitura e reviver o que eu havia lido. Porém, o livro é bastante forte e as atrizes, muito jovens, nem sempre deram o tom esperado, pelo menos para quem já conhecia a obra,  por exemplo, a fala central do livro "o inferno são os outros" saiu quase sem querer, quase não foi notado, faltou mais dramaticidade, talvez um tom a mais, um olhar diferente.

Outras duas questões importantes: na adaptação, trocou-se uma personagem masculina (essencial no texto de Sartre, pois traz a luxúria) por uma personagem feminina, sendo assim três mulheres dividiram o mesmo "quarto" e não duas mulheres e um homem, como no texto original, isso, de certa forma, fez o texto diminuir e perder um pouco a sua essência; pois retirou-se falas que representavam as "angústias" ou estereótipos masculinos; ao mesmo tempo,  a discussão sobre a nossa necessidade de nos olharmos no espelho e nos sentirmos sempre bonitos ou "bem" para os outros foi reduzido e não teve a mesma dimensão da obra original.

Um segundo elemento importante, que retrata  uma questão antiga: toda adapatação é uma interpretação do adpatador e, daí talvez, esteja o grande "erro" de concepção da peça: a ideia de Sartre é ilustrar   o inferno na concepção dele, na adaptação juiz-forana o inferno vira um manicômio. Na última cena, as três personagens aparecem com suas camisas de força, como se tudo visto e vivido não tivesse passado de uma grande loucura, enquanto Sartre quer mostrar um possível desfecho da vida, ou o outro lado da vida,  a adaptação nos leva a refletir, como mesmo aparece no panfleto da peça:  "o espectador entender um pouco mais sobre a dinâmica da vida!"

De qualquer forma, penso que as adaptações, tanto as teatrais como as cinematográficas, são formas de fazer com que o espectador seja apresentado às obras literárias que não chegam ao grande público. Tenho certeza de que alguns dos 40 espectadores (contagem feita pelo Raphael e pelo Marcos) que assitiram à peça saíram da peça com vontade de ler o livro de Sartre. Neste ponto, penso que a peça contribui com o incentivo à leitura e isso já é um enorme mérito dos artistas que montaram, adaptaram e interpretaram aquela peça. 

                                                    Carla Machado 

Nenhum comentário:

Postar um comentário