segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

Como leitura para o próximo encontro, teremos o romance "Triste Fim de Policarpo Quaresma", de Lima Barreto, por meio do qual o autor faz uma crítica ao nacionalismo ufanista do final do século XIX e início do século XX.
Contudo, o texto vai mais além: é um embate entre a utopia e a realidade, pois o sonho de Policarpo Quaresma acaba por levá-lo a um trágico fim, sendo condenado à morte pelas próprias forças políticas que ele apoiava. Assim, aquele que tanto sonhou com um país mais justo e com menos desigualdades é derrotado em seus ideais.
O personagem nos lembra bem aquela perspectiva quixotesca, uma vez que o grande anseio de Quaresma o conduz a uma causa perdida, que parece existir somente pra ele. Afinal, a paixão por seu país é ao mesmo tempo a causa de sua loucura, pois não é o bastante para protegê-lo da fúria do sistema político e social em que vive.
Temos, assim, uma oportuna leitura sobre o nacionalismo exacerbado e os rumos da nossa primeira República, o que, aliás, não está tão diferente da República dos nossos dias, a qual ainda insiste num tipo de nacionalismo alienante pra esconder males sociais que apenas superficialmente têm sido contornados, enquanto usa a máquina pública primeiramente em causa própria.
Portanto, apesar de ter sido escrito há mais de 100 anos, a obra pode perfeitamente dialogar com o atual contexto nacional e com os “quixotes” contemporâneos que ainda idealizam um país melhor...
Considerado pela crítica literária um dos grandes escritores do Pré-Modernismo brasileiro, fica então a boa narrativa de Lima Barreto para o encontro de fevereiro. Publicada inicialmente em folhetins, em 1911, na edição vespertina do Jornal do Commercio do Rio de Janeiro, a obra foi impressa em livro apenas quatro anos depois.
Por Paulo Tostes





Para uma breve nota sobre a próxima leitura do grupo, Um rio chamado tempo, uma casa chamada terra, de Mia Couto (2005), vale começar pela epígrafe do primeiro capítulo, onde o romance já nos mostra a que se propõe: “Encheram a terra de fronteiras, carregaram o céu de bandeiras. Mas só há duas nações – a dos vivos e a dos mortos” (COUTO, 2005, p. 13). A percepção do escritor ao reconhecer o caráter híbrido das culturas nos aponta que estas, longe de serem monolíticas, adotam elementos linguísticos e culturais de diversos povos, e que buscam ultrapassar as fronteiras nacionais e suas pretensões imperialistas.
No romance, um jovem universitário precisa voltar à terra natal para o funeral do avô, cuja morte, na verdade, ainda não está completa. Após anos de ausência, o neto favorito é incumbido então de estar à frente de uma cerimônia fúnebre que esconde desígnios além da compreensão dos homens.
É nesse sentido que Mia Couto propõe outra percepção dos espaços – outras fronteiras –, onde a fluidez narrativa demonstra que a ficção não é necessariamente o contrário do verdadeiro, mas é capaz de apontar verdades até então encobertas pelas verdades históricas. Assim, ao romper com os limites do discurso racional do colonizador, o escritor moçambicano procura reinventar Moçambique, incorporando-lhe o vigor cultural de uma África que os séculos de dominação haviam tentado enfraquecer.
         Certamente a arrogância do pensamento moderno e civilizado, cercado de certezas que a tecnociência passou a sustentá-lo, deixou de lado o interesse pela totalidade, passando a se concentrar no estudo do fragmento e supondo que, por meio deste, alcançaria uma maior objetividade, própria do fazer científico. Com isto, considerou magias e mitos como algo irracional e irrelevante para o entendimento da vida social, visto como material descartável e criado pela mente obscura de primitivos que teimam em não ingressar no curso da história.
       Não é por menos que na citação: “sou como a palavra: minha grandeza é onde nunca toquei” (COUTO, 2005, p. 255), Mia Couto nos instiga o redimensionamento dos espaços e das paisagens que ocupam a geofísica de Moçambique. Em outras palavras, essa citação poética nos sugere que a nação, ao definir um espaço que seja seu e um outro que seja adverso, afirma-se de forma arbitrária, pois desconsidera que o homem não estabelece fronteiras em sua sensibilidade e nem tampouco em seu ir e vir.

Eis, portanto, uma boa reflexão para a leitura de janeiro... Paulo Tostes