sábado, 23 de outubro de 2010

Uma pausa para a reflexão política...

O Historiador e Sociólogo, José Murilo de Carvalho, em um texto intitulado Fundamentos da política e da sociedade brasileira, incluído no livro Sistema Político Brasileiro: uma introdução, cuja obra é organizada pelos Professores Lúcia Avelar e Antônio Cintra, aponta que o Brasil tem o seguinte desafio em sua política, a saber: combinar liberdade, participação e justiça social.
Liberdade, neste caso, não é entendida como a de mercado, e sim liberdade de escolhas individuais: orientação sexual, crença religiosa, pluralismo de ideias, voto facultativo etc.
De fato, o Brasil enfrenta em suas “coxias” políticas este desafio. Podemos constatar essa questão na atual eleição para presidente, aonde aparecem questões como aborto, casamento civil de homossexuais, que, na verdade, é uma matéria que pertence ao legislativo, e não ao executivo. No entanto, como em todas as eleições, os candidatos a presidente gostam de misturar alho com bugalhos, a fim de desviar questões pertinentes a um debate mais profundo e produtivo sobre a sociedade brasileira, restando as enfadonhas trocas de acusações, de intrigas. Claro, isso se deve também a uma posição acrítica e desinteressada da sociedade, que age como um infame e desgraçado Big Brother, analisando os próximos capítulos de acusações, de intrigas; quem soube dissimular melhor... E quem aproveita dessa situação, no final das contas? A mídia é claro, além dos candidatos desinteressados em pensar o Brasil.
Ainda poderíamos refletir mais um pouco na questão sobre liberdade: o Estado é de fato separado da moral religiosa? Se o é, porque em legislações pontuais, como o aborto e o casamento homossexual, a fé religiosa é determinante? Por outro lado, se entendemos democracia como decisão da maioria, sendo esta representada pelos parlamentares, a posição moral religiosa na legislação brasileira faz sentido, visto que a maioria da população é cristã.
No que se refere à participação política é visível que a maioria de nossa sociedade se desinteressa, tendo que fazê-la por lei, obrigados; sem conhecimento do programa dos partidos, da biografia dos candidatos e das propostas em pauta. E, por isso, muitas vezes uma dentadura é bem vinda.
Infelizmente, por influência do patrimonialismo, nossa sociedade tem pouca noção da res publica, não a valorizando como algo coletivo. E para um país que almeja liberdade, necessariamente, é preciso ter participação política, conscientização de seus direitos e dos mecanismos de acesso para valer seus direitos. Aqui, fica mais uma nota: só é possível uma participação política com investimentos de peso em educação e tecnologia, visando sua máxima qualidade na socialização do conhecimento acumulado, pela sociedade ao longo do tempo.
Já, no último tópico, temos a justiça social, na qual temos muito caminho para percorrer: aumento do trabalho formal, distribuição de renda, saneamento básico, política de habitação, acesso de qualidade a serviços essenciais, como saúde e educação.
Bem, por que falar sobre isso, afinal? Simplesmente porque estamos em período de eleições, mas não somente isso, porque política deveria ser discutida no cotidiano, e não em 2 em 2 anos.
O Brasil parece que já se acostumou que política é um debate de acusações, trocas de ofensas, falta de ética, promessas sicofantas. Isso tudo se deve a 3 razões, no mínimo: 1ª) falta de investimento em educação básica, principalmente em uma educação política; 2ª) cegueira religiosa dos militantes, que professam sua religião política sem serem autocríticos, levando a pobreza do debate, além de uma discussão superficial da sociedade brasileira, desrespeitando o eleitor e o voto; 3ª) o eleitor, que se deixa levar pela cretinice do argumento que política é sujeira, corrupção, não se interessando em participar ativamente desta crucial atividade humana, a política.
Por Raphael Reis - 24/10/10

Um comentário:

  1. Caro Raphael,
    Muito interessante e pertinente as suas reflexões. Realmente o exercício da política é algo inerente a qualquer sociedade. Afinal, já dizia Sócrates: "O ser humano é essencialmente político". No entanto, uma questão a ser questionada é exatamente a disponibilidade da nossa sociedade em discutir política no seu dia-dia. A nossa mídia de massa não se mostra nem um pouco interessada em discuti-la. Vale lembrar que mesmo com o forte crescimento da internet como meio de comunicação, a tv brasileira é ainda o principal meio de comunicação da imensa maioria da nossa população. Exatamente este veículo simplesmente se abstém de uma discussão séria e profunda das nossas demandas enquanto nação. A indisposição de uma discussão política de qualidade mesmo pelas autoridades políticas(por motivos diversos e conhecidos) nos coloca diante de um panorama eleitoral onde questões morais e religiosas e um crescente denuncismo de ambos os lados distoam do cerne de uma reflexão política de qualidade de que tanto carece o nosso querido Brasil.

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